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segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Trabalho educação física 2012 ( 2º trimestre )

Trabalhos ensino Médio ( Educação Física 2012 2º trimestre ) ***RESUMO***

O resumo  é para ser entregue nas mãos da Coordenadora Andrea o Mais rápido possível !


http://www.scielo.br/pdf/pp/v19n1/a17v19n1.pdf


Lembrando que o modelo de como deve ser entregue o trabalhdo esta postado no BLOG ou no endereço

http://bsjoi.ufsc.br/files/2010/09/Modelo_de_trabalho_academico.pdf 

***  Por gentileza entreguem o mais rápido possível ***



Pro-Posições, v. 19, n. 1 (55) - jan./abr. 2008

A significação nas aulas de Educação Física: encontro e
confronto dos diferentes “subúrbios”1 de conhecimento
José Carlos Rodrigues Júnior* e Cinthia Lopes da Silva**

Resumo: Este trabalho propõe reflexões sobre a significação nas aulas de 

Educação Física

escolar e sobre a ação didática direcionada ao encontro e ao confronto de conhecimentos. Para
isso, basear-nos-emos em situações de ensino que compõem nossa experiência como professores
de Educação Física e em referenciais teóricos provindos das Ciências 

Humanas. Os alunos
chegam à aula com certo entendimento a respeito dos elementos da cultura corporal; o professor,
por meio de sua ação pedagógica, pode provocar confrontos com tais conhecimentos, com o
intuito de levar os jovens a identificar e compreender os temas estudados, de maneira
sistematizada. Nesse processo didático, a significação é elemento fundamental a ser considerado
para uma mediação que vislumbre a revisão de idéias e de valores.

Palavras-chave: Educação Física escolar; didática; conhecimento; significação.

Abstract: This work proposes reflections on the signification of Physical Education in the
school environment and on the didactic action directed to the meeting and confronting of
knowledge. For such, we will base ourselves on teaching situations that compose our experience
as Physical Education teachers and also on a theoretical frame of reference from the Human


Sciences. The students arrive in class with some amount of knowledge concerning the elements

of body culture; the teacher, through her pedagogical action, may challenge such knowledge,
intending to lead the students to identify and understand the studied subjects, in a systematized
way. In such a didactic process, signification is a key element to be considered for a mediation
that glimpses the revision of ideas and values.
Key words: Physical Education at school; didactics; knowledge; signification.

Introdução
Nas reflexões apresentadas, buscamos esclarecer questões relacionadas à
significação nas aulas de Educação Física e à ação didática direcionada ao
* Mestrando na Faculdade de Educação Física da Unicamp. Bolsista CNPq. Membro do Grupo de
Estudo e Pesquisa Educação Física e Cultura (GEPEFIC). rodriguesjcrj@hotmail.com
* * Doutoranda na Faculdade de Educação Física da Unicamp. Bolsista CAPES. Membro do Grupo
de Estudo e Pesquisa Educação Física e Cultura (GEPEFIC). cinthialsilva@uol.com.br

1. Termo utilizado por Geertz (2003) para referir-se aos diferentes sistemas culturais.
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encontro e ao confronto de conhecimentos entre professores e alunos. Para isso,
basear-nos-emos em situações de ensino que compõem nossa experiência como
professores – atuação com gestores da escola, com alunos da Educação Básica e
em cursos de graduação e especialização em Educação Física –, fundamentandonos
em referenciais provindos das Ciências Humanas.
O lidar com saberes que os alunos já possuem é, para nós, um trabalho
didático constante. Se, por um lado, os alunos chegam às aulas de Educação
Física escolar ou aos cursos destinados ao processo de formação de professores e
gestores da escola com certas referências sobre temas específicos da área, por
outro, é fundamental a mediação pedagógica para a construção de conhecimento
sistematizado, de modo a gerar condições para a produção de múltiplos sentidos
para os temas estudados. A ação didática que permita o encontro e o confronto
de conhecimentos entre professores e alunos pode favorecer a troca de saberes
entre tais sujeitos e a compreensão da complexidade inserida nos fatos da vida;
pode também ser um momento rico de sentidos e de possibilidades para a
escolha (de valores, de modos de ser e de agir no mundo).
Para a construção de tal ato pedagógico é necessário respaldo teórico a respeito
de como lidar com o senso comum, esclarecendo como se dão a circulação de
significados no cotidiano da vida e o processo de compreensão. Para atingir tal
propósito, inicialmente apresentamos características do conhecimento que
estamos denominando de “senso comum” e a necessidade de mediação
pedagógica para que os alunos possam identificar a complexidade que envolve
os temas específicos da Educação Física – o corpo e as práticas corporais de
maneira geral. Em seguida, aprofundamos a discussão sobre a circulação de
significados na vida cotidiana e sobre o conceito de compreensão, tendo como
base as idéias de Mikhail Bakhtin. Na terceira parte do texto, buscamos um
diálogo com autores atuantes na Educação Física, que dão pistas para o estudo
da significação, partindo de questões específicas da área. Esperamos, com esse
caminho teórico, instigar a construção de ações didáticas que se proponham a
lidar com os significados atribuídos ao corpo e às práticas corporais que circulam
na sociedade contemporânea, de modo a dar “voz” aos alunos, instigar sua
contrapalavra e construir condições que possibilitem a compreensão de tais
temas como fenômenos sociais.
O senso comum como “subúrbio” mais antigo de conhecimento
O senso comum permite ao homem estruturar sua forma de pensar, de
planejar, de visualizar e de entender o seu entorno ou a realidade em que está
inserido, funcionando como parâmetro, construído e ordenado a partir de “teias
de significados” que os homens tecem em interações com seus pares, o que
Geertz (1989) denomina de cultura.
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Esse sistema cultural permite uma compreensão imediata da realidade, possui
aceitação por grande parte dos sujeitos, fornecendo argumentações aparentemente
“incontestáveis” que compõem saberes veiculados em um ambiente sociocultural
e responsáveis pela solução dos mais diferentes problemas cotidianos.
As possibilidades de resolução de tais problemas cotidianos são construções
provenientes da experiência de vida do ser humano, de explicações edificadas e
transmitidas por seus antepassados e que não necessitam de comprovações
apuradas metodicamente, pois o próprio ambiente e seus atores os validam.
Geertz (2003) atribui ao senso comum propriedades ou quase-qualidades
que permitem identificar, alcançar, valorizar e caracterizar sua dinâmica, além de
diferenciá-lo de outros sistemas culturais como a ciência, a arte, a religião, etc.
A primeira dessas propriedades, segundo o mesmo autor, é a naturalidade,
que atribui a certos assuntos ou temas um tom de “isso é óbvio”, um jeito de
“isto faz sentido” ou “é assim que as coisas funcionam”, ou seja, fatos e
acontecimentos são vistos como “naturais”. No sentido de que, para um
determinado fenômeno social, existe uma explicação, uma resolução imediata
e eficaz, considerada intrínseca e inerente, sem necessidade de reflexão.
Na Educação, há exemplos a respeito da naturalidade. Segundo Firme
(1994), os mitos sobre a avaliação existentes na escola engessam o processo
educacional. A autora relata que, lamentavelmente, a reprovação de crianças e
jovens é vista como um “processo natural”, “inevitável”, e a explicação a esse
fenômeno sustenta-se na preservação da qualidade de ensino. Aceita-se a evasão
como um processo “normal” dos “fracassados”, sem refletir sobre os múltiplos
fatores que a ela se podemrelacionar de fato, dentre os quais, a maneira como a
avaliação é realizada, por exemplo. Notamos que as características do senso
comum podem ser identificadas também na escola.
A segunda das propriedades, a praticabilidade, seria a demonstração de
uma certa “sagacidade”, de prudência e de equilíbrio nas ações planejadas e nas
resoluções de problemas – são diferentes formas e maneiras, amplamente
conhecidas e difundidas por todos os atores sociais de um determinado grupo,
de lidar com as questões do cotidiano (Geertz, 2003). Ao retomar o fenômeno
da reprovação dos alunos na escola, poderíamos dizer que tal fato demonstra
uma tentativa de resolução imediata da situação, sendo tal prática conhecida e
detentora de certo “reconhecimento” ou prestígio por parte dos atores envolvidos
no processo (pais, diretores, professores, coordenadores).
Já a “leveza”, segundo Geertz (2003), é uma “quase-qualidade”, que faz
demonstrar que um assunto comentado é tudo aquilo que parece ser, sem
questionamentos, ou seja, o bom senso atribui uma “simplicidade” ou uma
“literalidade” aos temas, “o mundo é aquilo que uma pessoa bem desperta e
sem muitas complicações acha que é” (Geertz, 2003, p. 135).
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O pensamento fundamentado na argumentação da reprovação é tão
difundido na escola que ela, a reprovação, passa a ser aceita de forma “simples”,
está impregnada no modo de pensar e de agir da escola, das famílias e da
comunidade mais ampla (Firme, 1994). Desta maneira, quando um professor
conversa com o pai sobre a dificuldade de seu filho, ambos, por entenderem ser
“melhor” para a criança, podem rapidamente chegar à decisão de reprová-lo,
pois esta é uma atitude bastante utilizada e reconhecida naquele ambiente.
A “não-metodicidade” é outra propriedade sinalizada por Geertz (2003).
Caracteriza-se por um pot-pourri de conceitos e saberes discrepantes e, até mesmo,
contraditórios. Não se apresenta de forma sistematizada, além de, ao contrário
do que exige o pensamento científico, não requerer comprovação. Seria uma
“sabedoria” – transmitida através de lendas, de provérbios populares, de mitos
e de crenças – que difunde uma forma particular de viver e de explicar o contexto,
a sociedade e o mundo em que vivemos.
O mito, sustentado por certos sujeitos, de que é bom para o aluno que ele
permaneça na mesma série se estiver com dificuldades2 é alimentado por uma
construção cultural não-metódica. Nesse caso, desconsideram-se diversos fatores
que podem justificar a dificuldade do aluno: o conteúdo de ensino distante de
seus interesses pessoais; a metodologia de ensino; a maneira como ele é visto
pelos demais alunos ao demonstrar que não compreende o assunto, dentre
outros. Para que essas outras possibilidades sejam consideradas, é necessário
ocorrer uma análise sistemática do caso.
A última propriedade do senso comum apontada por Geertz (2003) é a
“acessibilidade”. Constitui-se como a possibilidade de apreensão, por qualquer
pessoa, das conclusões do bom senso e seus significados, não exigindo
especialização, estudo ou grande poder específico no entendimento de qualquer
situação a que o indivíduo é submetido (Geertz, 2003).
A concordância por vezes ocorrida entre os atores atuantes na escola – pais,
professores, gestores, demais funcionários e os próprios alunos –, com relação
ao fato de a reprovação ser a melhor saída para alunos com dificuldades ou para
aqueles que não atingem a nota mínima estabelecida pelo sistema educacional
parece ser exemplo de como esse mito é facilmente acessado e impulsionado
pela tradição.
Geertz (2003), metaforicamente, entende o senso comum como um tipo
de “subúrbio”, já que, apoiado em Wittgenstein (1953), compara a linguagem
a uma cidade antiga, que agrega constantemente novos “subúrbios” à sua
estrutura, como os simbolismos da química e do cálculo infinitesimal, que
foram adicionados à linguagem ao longo do tempo. O senso comum, comparado
2. Esse é um dos oito mitos sobre a avaliação apresentados por Firme (1994).
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com outros “subúrbios”, como a ciência, a ideologia e a arte, seria um dos mais
antigos da cultura humana, servindo como um “impulso de base” para a
construção posterior dos demais.
Podemos, portanto, entender o senso comum como fundamento para os
demais sistemas culturais, dentre os quais destacamos o conhecimento científico
que, sistematicamente elaborado ao longo da história da humanidade, é objeto
a ser socializado nas escolas. Assim, considerado como um tipo de sistema
cultural, o senso comum evidencia seu papel fundamental: fornece sustentação
a explicações de fatos específicos da vida humana. Diante disso: “O bom senso
não é aquilo que uma mente livre de artificialismo apreende espontaneamente;
é aquilo que uma mente repleta de pressuposições conclui” (Geertz, 2003,
p.127).
Portanto, o senso comum equipa os indivíduos de forma imediata com uma
série de saberes necessários para o entendimento de temas freqüentes, na
realização de atividades do dia-a-dia e na resolução de problemas do cotidiano.
A “eficiência” desses saberes é de certa forma legitimada pela experiência do
indivíduo e de seu grupo. Estes saberes passam a não ser mais questionados
pelos atores sociais.
Pressupostos a respeito da aula: convite à produção de múltiplos
sentidos
O conhecimento tácito ou do senso comum, como menciona Geertz (2003),
pautado nas “primeiras impressões” a respeito de determinado fenômeno social,
está em todos os espaços que podem ser imaginados de convívio humano; nesse
sentido, ele está na escola e nas aulas de Educação Física. Os alunos chegam
com certo entendimento a respeito das coisas do mundo, dos temas que serão
tratados durante os anos escolares pelas diferentes disciplinas.
Também para as aulas de Educação Física, especificamente, podem trazer
algum conhecimento a respeito dos conteúdos de ensino, com características
do senso comum. Idéias como: “esporte é saúde”, “esporte como solução para
retirar crianças e jovens das drogas”, “esporte ajuda no desenvolvimento da
inteligência”, circulam cotidianamente nos meios de informações, nas conversas
do dia-a-dia, em projetos governamentais, compondo, assim, as representações
dos alunos com relação ao tema. Outro ponto a considerar é a referência
predominante da prática esportiva na atual sociedade, fortemente centrada no
esporte de alto rendimento e em valores como o individualismo e a competição.
Pensar possibilidades de intervenção em Educação Física que tenham como
objetivo a construção de conhecimento acerca de temas específicos da área, de
maneira sistematizada, implica considerar as representações dos alunos, as
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referências prévias que possuem acerca dos temas tratados — essa é uma premissa
para certa concepção do que é a aula.
Roseli C. Fontana, autora, dentre outras obras, do texto “Sobre a AULA:
uma leitura pelo AVESSO”, foi inspirada pelo livro Em sobressaltos-formação de
professora, fruto da tese de doutorado de Maria do Rosário Magnani, em que
esta relata que, em uma aula, respondeu aos alunos que lhe perguntaram sobre
a maneira como preparava suas aulas, dando a eles a “Receita de ambrosia”.
Assim como Magnani, Fontana apresenta uma discussão sobre a aula, sua
realização e o tipo de relação entre professores e alunos. Suas idéias são de
grande contribuição para as reflexões aqui apresentadas: para ela, a aula é um
acontecimento inter-subjetivo, permeado por sentidos, lembranças,
reciprocidade, escolhas. A aula, segundo os comentários de Fontana (2001,
p.32), constitui-se como:
[...] ensaio e rito, preparação e entrega a um processo interativo,
que acontece e se repete, sempre necessariamente, entre sujeitos
organizados socialmente, para culminar em solidão, ruminação,
recolhimento e lembranças.
A aula é antecipação, ensaio, circulação de sentidos, antes mesmo que o
encontro com os alunos aconteça. Isso porque a sua preparação é permeada de
intenções e de sentidos construídos, atribuídos ao encontro que está por vir. A
concretização da aula humaniza professores e alunos porque, segundo Fontana
(2001, p.32):
[...] mais do que seres humanos colocados face a face, a relação
de ensino instaurada pela aula implica o encontro e o confronto
entre sujeitos que ocupam lugares sociais distintos – o lugar do
professor e o lugar de alunos, configurando, contraditoriamente,
uma unidade social.
A autora sinaliza para o fato de que a relação pedagógica é uma construção
conjunta; no entanto, há que considerar os “lugares” ocupados socialmente
pelos diferentes sujeitos. O professor, durante a exposição de suas idéias em
uma aula, por exemplo, na tentativa de realizar determinada “leitura dos alunos”,
talvez atente para expressões, gestos, palavras, atitude destes. Ele pode, ainda,
ignorar os alunos durante seu discurso, na tentativa de controlar os sentidos
que se produzem na sala de aula (Fontana, 2001).
A aula de Educação Física é também exemplo de “leituras” que o professor
realiza de seus alunos. Por ser esta uma disciplina que lida diretamente com o
corpo, as diferenças em relação às habilidades desenvolvidas pelos alunos nas
diversas manifestações humanas (ginástica, jogo, dança, esporte, luta etc.) e os
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sentidos dessas ações podem qualificar uma “leitura” mais atenta ou mais
autoritária, preconceituosa, corretiva, de controle do corpo, como tem ocorrido
tradicionalmente, na própria história da área.
Como qualquer fenômeno da vida humana, a aula é repleta de significados,
de trocas, de encontros e confrontos de conhecimentos. Podem-se atribuir ao
fenômeno social da aula o encontro e o confronto dos “subúrbios” (do senso
comum e do conhecimento sistematizado), geradores de condições para a
produção de múltiplos signos a respeito dos conteúdos ensinados.
Mikhail Bakhtin (1990) contribui para aprofundamentos nessa discussão,
justamente por partir da filosofia da linguagem para definir e explicar como se
dá a circulação de signos na vida cotidiana. Segundo o autor:
Tudo o que é ideológico possui um significado e remete a algo
situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo o que é
ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia. Um
corpo físico vale por si próprio: não significa nada e coincide
inteiramente com sua própria natureza. Neste caso, não se trata
de ideologia (p.31).
A premissa de que tudo que é ideológico possui um significado demarca o
caráter propositivo, intencional das expressões humanas, contrapondo, assim,
à visão de ser humano passivo uma visão que considera a dinâmica das relações
sociais e a intersubjetividade na construção de conhecimentos. Esse conceito
contribui para pensarmos os sujeitos participantes da dinâmica social
educacional como, ao mesmo tempo, receptores e produtores de significados.
Na Educação Física, particularmente, essa definição de signo renova o
discurso tradicional da área, uma vez que confronta a idéia de ser humano
biológico com o conceito de ser humano social que expressa, o tempo todo, um
conteúdo ideológico por meio de suas ações.
Bakhtin (1990) também afirma que o fato de o signo ser uma “encarnação
material”, isto é, expressa como som, como massa física, como cor, como
movimento do corpo, é que torna possível estudá-lo metodologicamente, porque
sua realidade é objetiva, constituindo-se, portanto, em um fenômeno do mundo
exterior (Bakhtin, 1990).
Por constituir-se como materialidade, podemos identificar o signo facilmente
no corpo pelo modo como os sujeitos sentam, cumprimentam, andam, correm,
praticam esportes e dançam. No entanto, se o signo pode ser observado,
estudado, pesquisado; se é um fenômeno do mundo exterior, é social, pois
pressupõe o olhar, a observação, a “leitura”, a interlocução com os outros sujeitos
que compartilham do mesmo contexto. Nesse caso, podemos afirmar que o
signo está na relação humana.
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O conceito de signo, com base nas idéias de Bakhtin (1990), dá pistas para
a questão de como lidar com o senso comum na prática pedagógica. Os sujeitos
chegam à escola, à faculdade, aos cursos de especialização com certas idéias e
noções sobre temas específicos da Educação Física, construídas a partir das
aulas de Educação Física escolar que tiveram, das práticas corporais vivenciadas,
das influências que recebem do meio em que vivem. Nesse caso, a relação
pedagógica poderá gerar conflitos, contrapontos, tensões a respeito desse saber
prévio, muitas vezes apoiado nas propriedades do senso comum.
A experiência com alunos de um curso de especialização para gestores –
diretores e coordenadores de escola de modo geral3- pode ser exemplo para
pensarmos a relação entre signo e conhecimento tácito dos alunos. De modo
geral, as turmas desse curso eram compostas por sujeitos que passaram pela
Educação Básica em diferentes décadas – 1960, 1970 e 1980, os mais jovens.
No início da aula foi solicitado que fizessem relatos sobre suas lembranças das
aulas de Educação Física que tiveram na escola. Pelos relatos, é possível ter acesso
às lembranças dos sujeitos: como as aulas eram organizadas; o que os professores
ensinavam; as aparências e as atitudes dos professores; o tipo e a cor do uniforme
obrigatório para a aula; os testes que o professor realizava para avaliar os alunos;
as tarefas solicitadas; os materiais que faziam parte da aula (bola, bastões, arcos,
apito, etc.); os espaços em que a aula ocorria. O que são tais lembranças senão
signos construídos e atualizados pelos sujeitos? Signos que, ao serem relatados,
são reafirmados, negados, criticados, avaliados durante a aula.
O professor, por meio de sua ação pedagógica, poderá possibilitar aos alunos
o embate, a tensão entre idéias, valores, signos, de modo que os alunos tenham
oportunidade de acesso e de construção de múltiplos significados para um
determinado tema. Essa seria uma maneira de reverem seu conhecimento tácito
acerca do tema, e a aula geraria uma situação de ensino desestabilizadora de tal
conhecimento. Não é intenção deste trabalho entrar no mérito de qual
conhecimento é – possa ser melhor ou pior, mas de pontuar que se trata de
conhecimentos diferentes ou – talvez possamos usar a metáfora de Geertz (2003)
– de “subúrbios” diferentes. O ponto de vista aqui defendido é de que a tensão
gerada em aula pode possibilitar que os alunos se coloquem diante de um
mesmo fato de diferentes maneiras, considerando a contradição implícita nos
fenômenos cotidianos, bem como os interesses e os valores predominantes;
enfim, a aula daria conta da construção de um conhecimento sistematizado
acerca do conteúdo ensinado.
3. Trata-se de um curso de especialização oferecido pela Secretaria de Educação do Estado de São
Paulo e organizado pela Faculdade de Educação da Unicamp aos gestores atuantes nas escolas
do ensino público do Estado de São Paulo.
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Esse entendimento da aula envolve assumir a relação como pressuposto
fundamental para construção de múltiplos signos a respeito de um mesmo tema,
já que, segundo Bakhtin (1990, p.35): “Os signos só podem aparecer em um
terreno interindividual”. Ou seja, para o acesso ao “subúrbio” do conhecimento
sistematizado são imprescindíveis a relação pedagógica, a interlocução e a troca
de signos. Na linha do mesmo autor, a consciência individual, sendo um ato
sócio-ideológico, adquire forma e existência nos signos criados por um grupo
organizado no curso de suas relações sociais (Bakhtin, 1990).
Outro conceito que parece contribuir para a construção de uma ação
pedagógica efetiva é a compreensão. Bakhtin (1990) nega a compreensão como
ato passivo, já que assumir essa idéia implicaria afirmar a sobreposição do
reconhecimento à compreensão. Segundo o autor, esta caracteriza-se pela
percepção do componente normativo do signo lingüístico, isto é, pela percepção
do signo como objeto-sinal, o que significaria pensar o papel do professor como
um transmissor de objetos-sinais; aos alunos, caberia o papel de reconhecer
tais sinais. A compreensão estaria, portanto, em segundo plano.
Parece ficar mais claro o contraponto de Bakhtin (1990), quando o autor se
refere à palavra como um território intersubjetivo e, ao tema, como um sistema
de signos dinâmico e complexo. Discutir o tema corpo com os alunos nas aulas
de Educação Física Escolar, por exemplo, tendo como foco a construção de
conhecimento sistematizado, e a compreensão implica considerar o conhecimento
que tais sujeitos possuem acerca do corpo, dos sentidos que circulam
na sociedade contemporânea, como beleza, saúde, prazer, sensualidade;
considerar os apelos da cultura de consumo e da circulação de valores, como a
padronização das aparências; perceber e questionar quem são os sujeitos que,
de fato, têm acesso às práticas corporais em seus momentos de lazer, quem
pode pagar por elas; avaliar o que é oferecido pelo serviço público. Enfim, é
necessário tratar o tema abarcando a complexidade de vida nele implícita e os
múltiplos fatores a ele relacionados.
No exemplo dado, professores e alunos estariam o tempo todo refazendo os
significados atribuídos ao corpo e sua relação com o mundo, participando
ativamente dessa construção, com direito a ouvir e a responder. Esse tipo de
ação pedagógica parece favorecer a compreensão dos alunos, já que se constitui,
segundo Bakhtin (1990, p.132), como: “[...] uma forma de diálogo; ela está
para a enunciação assim como uma réplica está para a outra no diálogo.
Compreender é opor à palavra do locutor uma contrapalavra”.
A didática com o foco no encontro e no confronto de conhecimentos entre
professores e alunos seria “movida” pela significação, definida por Bakhtin (1999,
p.132) como “[...] palavra enquanto traço de união entre os interlocutores”.
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A situação de ensino abaixo relatada, vivenciada com alunos de um curso de
formação em Educação Física, é um exemplo que talvez possa sintetizar esses
conceitos de compreensão e significação aqui apresentados.
O planejado para a aula era uma discussão a respeito dos pressupostos teóricos
de um estudioso da mídia e, posteriormente, um exercício aplicando os conceitos
estudados. Realizamos, inicialmente, uma discussão sobre os modos de operação
da ideologia pela mídia. No segundo momento, os alunos aplicaram o que foi
estudado no momento anterior, em matérias de revistas que eles próprios
selecionaram e trouxeram para a aula4. A surpresa foi quando um aluno
perguntou se, em uma mesma matéria ou propaganda de revista, poderia haver
mais de um modo de operação da ideologia. Essa era uma questão que não
havia sido considerada na preparação da aula. A situação gerou conflito imediato,
porque, se fosse dito que sim, talvez não houvesse argumentos suficientes a
serem sustentados pelo professor. A resposta negativa poderia restringir as idéias
do aluno a respeito da tarefa e do tema da aula. A saída imediata foi: “talvez,
deixe-me ver”. A resposta permitiu conversarmos sobre o assunto e toda a
argumentação do aluno pareceu coerente com as idéias do autor estudado.
Esse “novo” construído pela pergunta do aluno, a dúvida do sujeito na posição
de professor e a argumentação posterior do aluno para sustentar suas idéias
parecem ser algo próximo do que Bakhtin (1999) explica como significação e
compreensão.
A aula de Educação Física na escola: a significação e os “subúrbios”
A aula de Educação Física na escola é um espaço muito importante de
circulação de significações referentes à cultura corporal, ou seja, às manifestações
humanas construídas historicamente por diferentes grupos sociais – jogos, lutas,
esportes, danças, ginástica, dentre outros. O professor atento ao conjunto de
signos atribuídos a tais práticas, que reconheça a aula de Educação Física como
uma prática social, pode possibilitar aos alunos o acesso à complexidade que
envolve os temas trabalhados, e sua ação pedagógica será direcionada à constante
tensão entre o conhecimento prévio dos alunos e o conhecimento sistematizado.
Essa postura poderá contribuir para a apropriação5 de novas e diferenciadas
formas de significar os aspectos tratados.
4. Revistas como Boa forma, Saúde, dentre outras, com conteúdo centrado na beleza corporal,
saúde, práticas corporais.
5. Concordamos com Smolka (2000), que afirma que “a apropriação não é tanto uma questão de
posse, de propriedade, ou mesmo de domínio, individualmente alcançados, mas é essencialmente
uma questão de pertencer e participar nas práticas sociais. Nessas práticas o sujeito – ele próprio
um signo interpretado e interpretante em relação ao outro – não existe antes ou independente
do outro, do signo, mas se faz, se constitui nas relações significativas” (p.10).
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Um exemplo para elucidar esse fato pode vir de um dos maiores eventos
esportivos do mundo atualmente em evidência: a Copa do Mundo de Futebol.
O professor pode problematizar sobre a maneira de jogar do brasileiro: ela é
diferente da de outros jogadores do mundo? Ela é igual em todos os lugares do
Brasil? O futebol deve ser jogado somente da forma como é transmitido pela
mídia, ou podemos jogá-lo de outras maneiras? Quais? Os alunos conhecem
outras? A aula, nesse caso, pode ser um espaço para a construção de ações,
geradas e geradoras de significação. Essa idéia pode ser aproximada do conceito
de apropriação de Smolka (2000), pois a tensão mantida entre aquilo que os
alunos já sabem e a possibilidade de construção de novas significações pode ser
o impulso fundamental para a participação dos sujeitos nesse tipo de prática
social, condição básica para a apropriação.
Uma ação pedagógica que enfoque o convite aos alunos para o encontro e
para o confronto de conhecimentos é inovadora em nossa área, pois pressupõe
que os educandos participem efetivamente da construção e do acesso ao
conhecimento sistematizado.
Nesta visão aqui apresentada de aula de Educação Física, a identificação dos
significados atribuídos pelos alunos ao corpo e às práticas corporais é
imprescindível para o ato educativo comprometido com uma formação
humanizante6.
Na Educação Física brasileira, podemos identificar autores que têm pensado
e discutido temas específicos da área, tendo como questão central a significação.
Não pretendemos aqui fazer uma revisão de literatura sobre todas as obras
publicadas, mas destacar autores que têm focado suas reflexões na compreensão
do ser humano como ser expressivo e que se constituem como interlocutores
deste referencial em que temos nos apoiado até o momento, como: João Paulo
S. Medina, Jocimar Daolio e Romildo Sotério de Magalhães, este em sua recente
dissertação de mestrado.
Medina (1990) foi um dos primeiros autores da Educação Física a propor
um diálogo com as Ciências Humanas para pensar os temas da área – corpo,
esportes, ginásticas, entre outros. Sua obra clássica Educação Física cuida do
corpo...e “mente” , publicada no início da década de 1980, propõe a revisão da
ação pedagógica na área e do próprio conceito de ser humano. O autor parte
das idéias de Paulo Freire e aponta para uma reciprocidade educativa na relação
entre professor e aluno, evidenciando que o contato entre ambos no processo
de ensino-aprendizagem poderia ser uma “riquíssima troca de energias”, em
6. Expressão utilizada por Medina (1990) para afirmar que o professor de Educação Física poderá
realizar um trabalho efetivamente humanizante, se entender o corpo na posse de todas as suas
dimensões.
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que cabe ao professor a organização e a sistematização desse processo educativo;
deixa claro, porém, que o aluno também influencia no processo.
Ainda que de maneira inicial, o autor dá pistas à área: “O ser humano se
movimenta sempre de uma forma simbólica e expressiva. Aquele que não procura
interpretar essas significações não pode estar sabendo exatamente o que está
fazendo” (Medina, 1990, p.49). Ou seja, essa idéia parece próxima das
afirmações de Bakhtin (1999) sobre o conceito de signo como “encarnação
material” e a significação como “[...] um potencial, uma possibilidade de
significar no interior de um tema concreto” (p.131), processo movido pela
inter-relação, pela interlocução com o outro, pela intersubjetividade.
Nesse sentido, não podemos pensar em uma aula de Educação Física que
não tenha como premissa a significação e o reconhecimento de que professores
e alunos aprendem e ensinam mutuamente. Medina (1990) traz também luzes
a respeito do ato educativo, ao afirmar que a incompletude do homem é o
principal fator a ser considerado no desenvolvimento de todas as suas
potencialidades e indicar as relações com seus pares como fundamentais para
torna-lo possível como ser humano. Essas afirmações do autor também vão ao
encontro do que procuramos mostrar até aqui: a relação como pressuposto
fundamental das múltiplas significações nas aulas de Educação Física.
Outro autor que nos chama a atenção é Daolio (2004), que analisa a forma
como autores importantes e de grande expressividade em nossa área apresentam
em suas principais obras o conceito de cultura – em alguns casos de forma
implícita, em outros, nem tanto – e propõe uma Educação Física da desordem:
indica a intersubjetividade, a individualidade e a historicidade como aspectos
fundamentais a serem considerados pelo profissional, como forma de
contraponto aos aspectos que chama de “elementos da ordem” – a subjetividade,
o indivíduo e a história.
A relação intersubjetiva, como aponta o autor, é de extrema importância, na
medida em que é estabelecida entre indivíduos – professor e alunos – que
compartilham do mesmo tempo histórico, mas de dinâmicas culturais
diferentes, “eminentemente simbólicas” e variáveis. Tal relação vem contribuir
de forma decisiva para o entendimento da aula como espaço de mediação
constante de significados.
Assumir a intersubjetividade é reconhecer a aula de Educação Física como
um ambiente de trocas de conhecimento, e não como um espaço de transmissão
unilateral do saber, e reconhecer a alteridade como princípio para a ação
pedagógica, em que o outro é considerado a partir de suas diferenças e na
diversidade de suas manifestações culturais.
Pela troca de conhecimento impulsionada pelo ato educativo, podemos
entender que se formará o conflito entre o conhecimento do senso comum e o
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conhecimento sistematizado a respeito do corpo e das práticas corporais. Essa
troca implica a construção de algo novo, fruto do contato entre professores e
alunos, gerando, como afirma Smolka (2000, p.9), “diferentes (efeitos) de
sentidos”.
Com as idéias até esse ponto desenvolvidas, talvez possamos sintetizar a
finalidade das aulas de Educação Física e de uma didática sustentada pelos
conceitos trabalhados. Magalhães (2006, p.112), em sua dissertação de
mestrado baseada na filosofia da linguagem, afirma que
O corpo precisa ser olhado como expressão da corporalidade, e
isso vai um pouco além das aulas de Educação Física. Não é o
caso de o professor de Educação Física assumir mais alguma
coisa, como às vezes deseja a escola. A nossa, no entanto, é:
propor a corporalidade como um tema e abrir possibilidades de
significação para toda a escola. Parece-me ser um projeto que
precisa começar na Educação Física, no interior das aulas.
Se o papel da aula de Educação Física for abrir possibilidades de significação
a respeito da corporalidade, uma didática que atenda a isso poderá ter como
base o encontro e o confronto de conhecimentos e a inter-relação entre os
sujeitos como fator de humanização. Com essa didática é possível vislumbrar
que os alunos terão oportunidade de acessar o conhecimento sistematizado
acerca da corporalidade e escolher sua forma de atuação no mundo.
Palavras finais: porta de livre acesso aos “subúrbios”
As reflexões aqui apresentadas buscaram diálogo com autores das Ciências
Humanas, como Clifford Geertz e Mikhail Bakhtin, e da Educação e Educação
Física. Essa construção viabilizou pensar a didática como ação que considera o
encontro e o confronto de conhecimentos entre professores e alunos
fundamentais para a troca de saberes, culminando na apropriação e na produção
de múltiplos sentidos atribuídos ao corpo e às práticas corporais. Tal concepção
propicia que os alunos possam fazer escolhas de valores, de modos de ser e de
agir no mundo.
Pensar o encontro e o confronto de conhecimentos é reconhecer a aula como
um espaço de construção conjunta entre alunos e professores; esta, por sua vez,
pode ser entendida também como a tensão necessária, que desestabiliza o
conhecimento do senso comum e possibilita a construção de “algo
novo”produzido a partir da inter-relação entre os sujeitos.
Esse “algo novo” significa um “movimento” cíclico de significação e de
constante trânsito entre os “subúrbios” do senso comum e do conhecimento
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